quarta-feira, 21 de maio de 2008

Velhos Argumentos Para a Nova CPMF

O presidente Lula reunido com ministros para discutir a criação de uma nova CPMF (0,08%) desta vez “exclusivamente” para gastos com saúde.
Trata-se da mesma argumentação para o lançamento da contribuição "provisória" - lembram-se? - anos atrás. Segundo, a proposta só faz sentido se o governo não tiver dinheiro para gastar com saúde.

Dados e declarações a considerar:

  • Ministro Mantega disse na semana passada que o Fundo Soberano será financiado com parte do excesso do superávit primário, algo como R$ 14 bilhões neste ano;
  • Ainda na semana passada, o presidente Lula editou Medida Provisória destinando mais R$ 7,5 bilhões no orçamento deste ano para reajuste de salários de funcionários civis e militares. Com isso, o crédito total neste ano para contratação e reajustes de servidores subiu para R$ 11 bilhões;
  • Para a política industrial anunciada na semana passada, o governo promete reduzir impostos para diversos setores da economia, com o que deixaria de arrecadar cerca de R$ 6 bilhões/ano;
  • Também na semana passada, o governo federal, para não aumentar o preço da gasolina reduziu a Cide - contribuição sobre combustíveis, - abrindo mão de mais R$ 2,2 bilhões/ano;
Em resumo, numa semana, o governo federal aumentou a previsão de gastos em R$ 21,5 bilhões e abriu mão de R$ 8,2 bilhões, tudo para este ano.
A "nova" CPMF arrecadaria R$ 8 bilhões/ano.

por Carlos Alberto Sardenberg em 19 de Maio de 2008

Comento:
A artimanha governista de preservar o presidente Lula do ônus de ressuscitar o monstrengo da CPMF deve ir por água abaixo, porque a Constituição prevê que só o governo pode propor a criação de contribuições sociais - o que impediria o Planalto de deixar a cargo da base aliada no Congresso a apresentação o projeto de um equivalente ao chamado "imposto do cheque".
Os líderes governistas já haviam definido que a "nova" CPMF teria alíquota de 0,10% - e não 0,08% como havia sido noticiado. Agora o PT procura uma solução que evite a inconstitucionalidade. Há também o problema da "noventena": a nova CPMF só poderia começar a ser cobrada três meses depois da sanção do presidente Lula.
Além dos gastos relatados por Sardenberg, a comissão de licitação da Secom (Secretaria de Comunicação Social) da Presidência de República lançou concorrência para contratar trabalho de divulgação do Brasil nos Estados Unidos, na União Européia e na Ásia. Foram habilitadas 13 empresas de comunicação e relações públicas para participarem da disputa da verba de R$ 15 milhões anuais.
O Palácio do Planalto pretende lançar "noticiário positivo" na mídia internacional através de uma estrutura permanente de comunicação no exterior. Segundo assessores do governo, o objetivo é atrair investimentos de diversas áreas, especialmente em infra-estrutura (essa função pertence atualmente ao corpo diplomático brasileiro).

O blog do Josias de Souza explica mais detalhadamente:
(...) O texto constitucional é claro como água de bica: só o governo pode propor a criação de contribuições sociais.
Diz o artigo 149 da Constituição (texto disponível aqui): “Compete à União instituir contribuições sociais...” Estabelece ainda que deve ser “observado o disposto nos artigos 146, parágrafo III [...], sem prejuízo do previsto no artigo 195, inciso 6º”.
Recuando-se ao artigo 146-III, chega-se ao seguinte: “Cabe à lei complementar: estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária [...]”
Ou seja: só Lula pode propor ao Legislativo a ressurreição da CPMF, uma contribuição social, pela via pretendida pelos deputados governistas, o projeto de lei complementar.
Avançando-se ao artigo 195, chega-se ao modelo de financiamento da seguridade social, que inclui a Saúde. Diz a Constituição que o dinheiro sairá do Orçamento da União, dos Estados e dos municípios e de contribuições sociais. Aqui entra a CPMF.
Descendo ao inciso sexto, depara-se com a regra vulgarmente conhecida como noventena: “As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver ...”
Significa dizer que, uma vez recriada, a CPMF só poderia começar a ser cobrada três meses depois da sanção do presidente da República. Tudo considerado, chega-se à seguinte conclusão: os líderes do consórcio que dá suporte legislativo ao governo produzirão uma afronta à Constituição se levarem avante o plano esboçado no almoço que realizaram nesta terça-feira (20).
Reunidos em torno de um repasto oferecido pelo líder do PTB, Jovair Arantes (GO), mandachuvas do PMDB, PT, PP e PR resolveram patrocinar a apresentação de projeto de lei complementar que ressuscita a CPMF.
Na nova versão, o imposto sobre movimentações financeiras seria definitivo, não provisório. Serviria para bancar o pretendido aumento nos gastos da Saúde, previsto na emenda 29. Teria alíquota de 0,10%. Que renderia coleta estimada em R$ 10 bilhões.
Diante das evidências que saltam do texto da Constituição só resta aos deputados governistas apelar a Lula para que recue de uma decisão anunciada na última segunda-feira (19).
Reunido com os ministros que integram o conselho administrativo, o presidente dissera que não lhe passa pela cabeça envolver o governo na busca de fontes de financiamento para o projeto que regulamenta a emenda 29.
Lula foi explícito: ou o Congresso providencia o dinheiro ou ele irá vetar o projeto que injeta dinheiro novo nas arcas da Saúde. Coisa escalonada. Aumentaria ano após ano. Até atingir a cifra de cerca de R$ 20 bilhões, em 2011.
Farejando o cheiro de queimado, os deputados cogitavam incluir a neo-CPMF na proposta de reforma constitucional enviada por Lula ao Congresso.
A idéia é, porém, rechaçada pelos deputados Antonio Palocci (PT-SP) e Sandro Mabel (PR-GO) –respectivamente presidente e relator da comissão que destrincha a proposta de reformulação do sistema tributário.
Assim, ou Lula é convencido a imprimir as digitais no projeto da nova CPMF ou a iniciativa dos deputados não resistirá a um questionamento no STF, guardião da Constituição. O que não faltam são oposicionistas e contribuintes dispostos a acionar o Supremo.

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