quinta-feira, 16 de julho de 2009

Liderança ou Messianismo?

Há uma abissal diferença entre liderança e messianismo. Entender no que consiste essa diferença vai ajudar-nos a interpretar melhor a realidade, sem sermos iludidos por aqueles que, de perfil messiânico, tentam se passar por líderes comprometidos com resultados alvissareiros, quando, na verdade, estruturam seus discursos sobre quimeras.

O problema é que o indivíduo com perfil messiânico possui traços carismáticos – sem eles, aliás, não existiria messianismo – e, por isso, à primeira vista, o messiânico é muitas vezes confundido com um líder autêntico. Quando o logro é descoberto, os estragos causados já podem ser de grande monta.

Quais são as características do messiânico? Ei-las:
  • Fixação fanática por um único objetivo;
  • Julga-se "ungido" para uma missão. Assim, na sua visão megalomaníaca, é sempre o "mais mais": o "mais ético", o "mais competente", o "mais querido de todos", "o que mais trabalha" e assim por diante;
  • Crítico feroz de quem ousa discordar de suas crenças;
  • Hábil retórico, com sensibilidade para captar o que a multidão adora ouvir. Seus discursos são sempre recheados de ditos espirituosos e de rompantes, envolvendo promessas rocambolescas;
  • Sempre costura soluções "meia-sola", ou seja, os problemas reais nunca são atacados e resolvidos, mas busca sempre paliativos que acalmem momentaneamente o ânimo geral;
  • Por ser hiperativo, agita todo mundo ao seu redor e, com isso, passa a imagem de trabalhador incansável;
  • Constrói uma imagem de "amabilidade" junto ao público, que passa a ser consumida e até exaltada por parte da mídia que perdeu o senso crítico de sua tarefa precípua;
  • Faz da dubiedade sua marca registrada, ou seja, discursa para os marginalizados pela vida (e com isso conquista a simpatia deles), mas não abre mão das mordomias que o dinheiro pode comprar;
  • Simplifica o que por natureza é complexo, na tentativa de passar a imagem de que qualquer problema, sob sua "liderança" será resolvido de pronto;
  • Cultua a ubiquidade, isto é, tenta estar simultaneamente presente a todos os eventos que agreguem valor à sua imagem (o curioso é que também possui o dom de "sumir" quando as coisas esquentam);
  • Hoje "está bom", mas amanhã ficará "melhor ainda", ou seja, através de propaganda maciça, procura somente passar mensagens de que, sob os seus cuidados, "tudo está ok, tudo ficará ok".
Para o messiânico, o universo inteiro é construído sobre a sua imagem. Ele, o messiânico, passa a ser uma espécie de "fiador do mundo". Sem sua presença, tudo desmoronaria.

Agora, em rápidas pinceladas, vejamos as características de um líder autêntico:
  • Formula um plano de trabalho focado em objetivos múltiplos;
  • Fixa as metas de realização dentro de um cronograma racional;
  • Não se julga o "escolhido", por isso tem a humildade de ouvir opiniões divergentes;
  • Reconhece quando erra e está disposto a mudar atitudes e modelos de gerenciamento;
  • É coerente no pensar, no falar e no agir;
  • Não permite que se cultue a sua imagem pessoal;
  • Não tem medo de tomar decisões duras, desde que sejam de fato necessárias;
  • Cerca-se de colaboradores selecionados com critérios técnicos;
  • Não se julga o "mais mais": reconhece que carece da ajuda de outras pessoas;
  • Delega atribuições, dá feedback sobre desempenho de sua equipe, reconhece e valoriza talentos individuais, mas estimula sempre o trabalho em equipe;
  • Sabe dialogar para buscar convergências nas divergências, sem ficar preso a monólogos autolaudatórios.

A História nos mostra que indivíduos com traços messiânicos que vieram a ocupar cargos de grande importância causaram sérios problemas, às vezes até tragédias devastadoras, pois alguns deles, tratados como se fossem líderes, na verdade eram, como se diz, "doidos varridos". Julgavam-se demiurgos, acima do bem e do mal.

O atual presidente do Brasil, aclamado por muitos como um "líder", não o é. Tem-se revelado um messiânico, com raro faro oportunista, desde que o contexto lhe permita continuar no poder. Numa paráfrase ao dito da atriz Regina Duarte sobre o "medo", antes da eleição do atual mandatário, diria que "é preciso ter medo sim, muito medo", das pessoas que se julgam ungidas.

O único messias autêntico registrado pela História foi o Christos, que acabou crucificado. Seus profetas na época, chamados (na belíssima língua grega) "hoi christoi theou", ou "os messias de Deus", também levaram chumbo. E olhe que defendiam a tese máxima do Messias real, a saber: a de que o seu reinado "não era deste mundo", e que o amor deveria ser o laço fraterno entre todos os homens de boa vontade.

por Luiz Oliveira Rios , no Diário do Comércio

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